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Ninguém é Santo Neste Mundo

Infelizmente, por falta de uma cultura Administrativa, o Brasil nunca desenvolveu a meritocracia, que é um sistema de seleção e promoção das pessoas mais capazes e treinadas para as funções de comando que irão exercer na comunidade.

Impera no Brasil o Nepotismo, o Paternalismo, o Favoritismo, em todas as esferas.

Nas Universidades Públicas, onde deveria prevalecer o Concurso Público, é incrível o número de filhos de professores que também são professores públicos.

Sem falar nas “Indicações”, onde os Gestores com um gesto de seu indicador apontam o amigo que irá ocupar um cargo importante, no governo ou nas empresas não meritocráticas.

Em vez de Meritocracia, usamos um termo que é Cargo de Confiança.

Isto ocorre a cada quatro anos, amplamente divulgado pelos jornais, quando presidentes e governadores precisam preencher centenas de “cargos de confiança” que compõem um governo.

O número exato de cargos varia de Estado para Estado.

Para o governo federal eu já ouvi estimativas que variavam de 2.000 a 20.000 cargos a ser preenchidos.

O problema é que a maioria dos políticos não conhece um número suficiente de pessoas em quem realmente possa confiar.

Por isso, as primeiras pessoas convidadas são normalmente amigos e parentes de irrestrita confiança.

Mas logo o desespero é tal que até genros, normalmente vistos com certa suspeita na escala familiar, são convidados para participar da equipe de governo. Não vou citar nomes, mas vocês saberão de alguns.

Não que amigos e parentes não possam ser pessoas competentes, mas a base de escolha é muito pequena para que a média seja qualificada.

Imaginem criar uma seleção nacional de futebol dessa maneira, entre amigos e parentes.

Você apostaria no seu sucesso?

O mesmo ocorre com nossas equipes de governo. Você apostaria no sucesso de um governo assim constituído?

Mas o número é limitado, e eu sei e você sabe que o governo acaba sendo lotado por pessoas de confiança de amigos, pessoas até desconhecidas do Presidente da República, o indicador-mor do Brasil.

A primeira decepção de cada novo governo e a primeira crítica que a imprensa lhe faz ocorrem por ocasião do anúncio da equipe e dos parentes contratados.

O pior é que a imprensa até insinua em alguns relatos, que parentes foram contratados para que todos se tornem ricos, o que pelos salários atuais do setor público é praticamente impossível.

Não, não é a ganância e vontade de ficar rico às nossas custas. Isto existe também sem dúvida, mas o grande problema é este meme que se infiltrou na cultura do Brasil que precisamos de fato ter cargos de confiança.

Você, honestamente, vê outra alternativa?

Pois há, é uma das missões do Administrador.

O erro que a maioria dos políticos eleitos comete é desconhecer uma das leis básicas da administração:

Todo cargo, seja público, seja privado, é de total e irrestrita desconfiança.

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Infelizmente todo colaborador, por mais amigo que seja, precisa ser tratado com certa dose de desconfiança.

Os maiores desfalques em empresas familiares são cometidos por parentes, onde não escapam nem filhos, muito menos genros.

Bons amigos então, nem se fala. De onde surgiu este mito de que amigo do peito e parente não roubam?

Essa prática não é exclusiva de nossos políticos.

A maioria de nossas empresas contrata diretores da mesma maneira, tanto que são chamadas de empresas “familiares”.

A saída para esse dilema é outra.

Em vez de contratar um amigo do peito, selecione o melhor e mais qualificado profissional possível para o cargo, independente de conhecê-lo ou não.

Em seguida, cerque o contratado de controles gerenciais, fiscalização interna, auditoria externa, o que for necessário para manter o pessoal na linha.

As multinacionais não trazem mais um presidente de confiança do exterior como faziam antigamente.

Contratam brasileiros, sejam eles amigos dos acionistas ou não.

Dois brasileiros, Alain Belda Fernandez e Henrique de Campos Meirelles, foram presidentes da matriz americana das multinacionais em que trabalhavam, o equivalente a contratar um americano para cuidar de nossa dívida interna.

Infelizmente no Brasil, o melhor administrador financeiro do país tem poucas chances de ser Ministro da Fazenda, se já não for amigo do presidente bem antes de sua eleição.

Cargo de confiança é simplesmente um conceito anacrônico, algo do passado pré-gerencial, da era do Gestor.

Num mundo competitivo, todos os cargos, incluindo os do governo, precisam ser de total e irrestrita competência, e não de confiança.

A rigor, num mundo globalizado, onde temos de dominar alguns segmentos da economia mundial, deveríamos estar contratando os melhores do mundo.

Pelo menos algum dia vamos começar timidamente contratando os melhores brasileiros desde o início.

PS – Se você, amigo ou parente de político, for convidado para um cargo de confiança nos próximos três meses sem ter pelo menos vinte anos de experiência na área, a nação encarecidamente implora: recuse delicadamente.

Publicado na Revista Veja, Editora Abril, na edição 1560, nº 33, de 19 de agosto de 1998, página 22

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